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O Navio-Monstro do Porão:
Uma Metáfora Sobre os Fantasmas que Construímos
O Navio-Monstro do Porão: Uma Metáfora Sobre os Fantasmas que Construímos
Navegamos pela vida como marinheiros em um vasto oceano, e em nosso porão, em meio a mapas desdobrados e equipamentos náuticos, construímos um navio secundário. No início, não passava de um projeto, um pequeno veleiro de brinquedo, feito com as madeiras de nossos medos e os tecidos de nossas inseguranças. Mas o alimentamos. A cada noite de insônia, em vez de acender as luzes, despejamos em seu porão o combustível da ansiedade. A cada crítica recebida, em vez de nos levantarmos, adicionamos uma tábua de autocrítica ao seu casco.
Com o tempo, o pequeno veleiro se transforma em um navio de guerra. É o nosso monstro, uma criatura de nossa própria autoria, nutrida por tudo aquilo que evitamos encarar. Ele tem a proa afiada da inveja, que usamos para cortar as conquistas dos outros, e as velas, tingidas com a cor do ressentimento, que nos levam para longe de quem amamos. Seus canhões, carregados com a pólvora da raiva, estão sempre prontos para atirar em nós mesmos, ou nos poucos que se aproximam.
O navio monstro não para de crescer. A cada fracasso, adicionamos um andar à sua estrutura, transformando-o em um arranha-céu flutuante de vergonha. A cada oportunidade perdida, o pintamos com as cores do arrependimento. Ele se torna nosso companheiro de viagem, nosso confidente, a criatura que conhecemos melhor do que a nós mesmos. A ironia é que acreditamos estar no controle dele. "Eu o criei", dizemos, "então ele me pertence". Mas é o navio que nos guia, nos levando para portos de melancolia e ilhas de isolamento. Ele nos afasta da luz do sol, pois não foi construído para ela.
O ponto de virada, para alguns, é o momento em que percebem que estão mais à deriva do que navegando. Observam o navio que criaram e veem não uma extensão de si mesmos, mas uma prisão flutuante. A embarcação é tão pesada, tão cheia de rancores e medos, que mal conseguem se mover. A única salvação é o ato de coragem de desconstruí-lo. Não se trata de afogá-lo, mas de desmontá-lo, peça por peça. Usar a madeira da raiva para acender uma fogueira de perdão, usar o tecido do ressentimento para costurar uma nova vela de esperança. É um processo doloroso, mas é a única maneira de finalmente sermos livres para navegarmos com nosso próprio navio, o de nossa essência, rumo a horizontes que o monstro jamais nos permitiria ver.
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