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A caverna e o quarto: o refúgio e o despertar
A caverna e o quarto: o refúgio e o despertar
Imagine que sua vida inteira se passou em um quarto. Não um quarto qualquer, mas um que você conhece nos mínimos detalhes: a textura da parede, a leve inclinação do piso de madeira, a forma como a luz da lua desenha sombras familiares sobre os móveis. Esse é seu universo, sua caverna. As janelas estão vedadas, mas não com persianas, e sim por uma espécie de névoa densa que, de tempos em tempos, se ilumina.
Essa luz que atravessa a névoa vem de algo que você não entende. Ela projeta sombras de figuras que se movem, dançam e contam histórias. E você, sentado na sua cama, acredita que essas sombras são a realidade. Elas são seus filmes favoritos, seus programas de TV, imagens na tela do seu computador ou do seu smartfone, seus feeds de redes sociais, as notícias que você lê. O mundo lá fora se resume a esses flashes de luz, a essas figuras bidimensionais que você conhece e julga. As vozes ecoam e você as ouve, as internaliza, acredita que elas são a verdade absoluta. O quarto é confortável, previsível e seguro. Você não precisa enfrentar o desconhecido, o frio, o perigo. Você se aninha em sua própria escuridão, satisfeito com as ilusões que a luz projeta.
Mas um dia, algo acontece. Uma pequena fresta se abre na névoa. Talvez um amigo tenha te contado algo sobre o mundo lá fora, ou uma notícia tenha te feito questionar a narrativa que você sempre aceitou. A princípio, você ignora, pois o conforto do quarto é muito atraente. As sombras são, afinal, as companhias de uma vida inteira. Mas a curiosidade é uma semente teimosa. Ela cresce.
Você se levanta, com o corpo ainda pesado pelo hábito de passar a vida sentado. A escuridão te abraça, mas a pequena fresta se torna um farol. Você se aproxima, tateia a parede e, com um empurrão que exige toda a sua força, a névoa se dissipa. A luz que te atinge agora não é filtrada. É intensa, brilhante, e dói. Seus olhos, acostumados à penumbra, se recusam a aceitá-la. Você pisca, recua, mas não pode mais voltar. O que você vê te atordoa.
A paisagem lá fora é vasta, colorida e cheia de vida. As figuras que antes eram sombras ganharam volume, cor e profundidade. Aquilo que você pensava ser a realidade não passava de uma projeção, uma ilusão. O mundo real é muito mais complexo, fascinante e assustador do que você jamais imaginou. As vozes que ecoavam e que você acreditava serem verdades absolutas são apenas parte de um coro maior, cheio de dissonâncias e harmonias.
O retorno ao quarto, à sua antiga caverna, é impossível. Agora que você viu a verdade, as sombras não têm mais a mesma graça. A cama não é mais tão confortável, o silêncio não é mais tão acolhedor. O quarto, que antes era um refúgio, se tornou uma prisão. O seu desafio agora é se adaptar à luz, caminhar no mundo real, e talvez, um dia, guiar outros que ainda estão presos no escuro. Sua nova jornada, a mais importante de todas, é a de viver no mundo que você antes apenas sonhava.
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