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sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Os átrios de Senhor!

Os átrios de Senhor: o significado dos templos cristãos na história

Uma característica de todas as religiões é a existência de “espaços sagrados”, ou seja, locais estreitamente associados com a realização dos atos de culto, e que, por essa razão, adquirem um valor especial para os seus fiéis. Isso se aplica tanto às religiões denominadas “primitivas”, com suas práticas animistas (atribuição de valores espirituais a elementos da natureza), quanto aos antigos cultos de povos mais evoluídos. Esse foi o caso dos gregos e dos romanos, com seus belíssimos santuários, bem como dos egípcios e das civilizações pré-colombianas (como os incas, os maias e os astecas), com suas monumentais pirâmides repletas de associações místicas. As chamadas “religiões vivas”, isto é, as venerandas tradições religiosas que sobrevivem até o presente, também são conhecidas pelo grande valor que atribuem aos seus locais de culto. Alguns exemplos conhecidos são as colossais estátuas de Buda encontradas em muitos pontos do Oriente, o Templo Dourado de Amritsar (da religião sikh, na Índia) e, entre os muçulmanos, a tenda negra da Caaba, em Meca, e a Mesquita de Omar, em Jerusalém. Por razões teológicas, históricas ou culturais, esses locais são altamente reverenciados pelos adeptos dessas religiões.

1. O período bíblico

Nessa questão, a tradição judaico-cristã é bastante complexa, demonstrando diferentes atitudes para com os seus espaços sagrados, ao longo da história. Segundo o Antigo Testamento, Jeová, o Senhor, deu instruções precisas para a edificação de um santuário onde o seu povo pudesse cultuá-lo de maneira especialmente significativa. Tanto o tabernáculo, ou seja, a tenda portátil utilizada na época das peregrinações de Israel, quanto o magnífico templo construído posteriormente por Salomão, representavam ao mesmo tempo a presença de Deus no meio do seu povo e o mistério e a sublimidade do Ser Divino, simbolizados pelo Santo dos Santos. Por cerca de um milênio o templo foi, ao lado da lei de Moisés, o centro da identidade do judaísmo. São muitas as passagens, notadamente nos Salmos, que demonstram o grande fascínio que a casa de Deus ou “os átrios do Senhor” exerciam sobre os israelitas piedosos (Sl 27.4; 65.4; 84.1-2,10; 134.1-2; Is 6.1-4). Destruído pelos babilônios, o templo foi reconstruído sob a liderança de Zorobabel e grandemente aprimorado por Herodes, vários séculos depois.

Também havia no judaísmo a consciência de que Deus não podia ficar confinado a um edifício, por especial que fosse (1 Rs 8.27; 2 Cr 6.18; Is 66.1-2), como Estêvão haveria de lembrar aos judeus e Paulo aos atenienses (At 7.48-50; 17.24). Jesus expressou essas duas correntes de tradição, por um lado reconhecendo e defendendo a santidade do templo, a “casa de oração” (Mt 21.12-13), e por outro lado relativizando-o ao indicar que o mais importante no culto a Deus não é o lugar em que ocorre, mas a maneira como é prestado – “em espírito e em verdade” (Jo 4.21-24). Dois fatores que contribuíram para o declínio do valor relativo do templo, tanto para os judeus como posteriormente para os cristãos, foram a sua destruição pelos romanos, no ano 70 da era cristã, e a existência das sinagogas entre os judeus da Diáspora. A sinagoga, um misto de centro comunitário, escola e local de culto, nunca teve a tremenda importância simbólica e mística desfrutada pelo templo de Jerusalém, mas foi acima de tudo uma resposta prática para uma nova conjuntura – a vida longe da Palestina.

2. Desdobramentos da igreja antiga

Os primeiros locais de culto utilizados pelos cristãos foram alguns recintos públicos e preferencialmente residências particulares, as conhecidas igrejas domésticas mencionadas em várias passagens do Novo Testamento (Rm 16.5, 14-15; 1 Co 16.19; Cl 4.15; Fm 1.2). Não se atribuía qualquer valor especial ou transcendente a esses lugares, mais ou menos como os judeus faziam em relação às suas sinagogas. O mais importante não era a igreja como instituição ou como espaço físico, mas o povo de Deus, a família da fé, o corpo de Cristo. Foi a experiência da perseguição e do martírio que começou a alterar essa perspectiva. Os lugares em que os heróis da fé deram a vida por amor a Cristo, ou nos quais os seus corpos foram sepultados, passaram a ser altamente reverenciados pelos cristãos. Em algumas cidades, estes passaram a reunir-se nesses locais ou perto dos mesmos, como foi o caso das famosas catacumbas ou cemitérios subterrâneos de Roma, a partir da época de Nero. Por outro lado, certos desdobramentos teológicos da igreja antiga levaram os cristãos a enfatizarem algumas instituições do Antigo Testamento, tais como os conceitos de sacrifício, sacerdócio e templo.

Embora não se tenha descoberto nenhum templo, isto é, edifício destinado especificamente para o culto cristão, anterior a meados do terceiro século, é certo que bem antes disso os cristãos tinham espaços sagrados grandemente reverenciados. Um importante ponto de transição nesse processo evolutivo foi o impacto causado pelo imperador Constantino, o primeiro líder do Império Romano a identificar-se com a nova religião. Ele não só concedeu plena liberdade religiosa aos cristãos, como engrandeceu a igreja e seus líderes de várias maneiras. Em Roma e outras cidades imperiais, várias basílicas (edifícios públicos romanos), algumas muito grandes e majestosas, foram transformadas em templos cristãos, sendo dedicadas aos mais diversos mártires, agora vistos como santos. Constantino também construiu a Basílica de São Pedro no local tradicional do martírio do apóstolo e, na Palestina, a Igreja da Natividade, em Belém, e a Igreja do Santo Sepulcro, em Jerusalém.

Muitos desses templos, grandes ou pequenos, destacavam-se pela presença de relíquias, ou seja, objetos relacionados com Cristo, Maria e os santos (um pedaço da cruz, os ossos de um mártir, etc.), o que os tornava especialmente atraentes como centros de peregrinação. Concomitantemente, a nova posição de poder e esplendor da igreja gerou uma progressiva elaboração do culto, surgindo uma liturgia complexa e impressionante. Os templos e outros locais sagrados adquiriram uma conotação profundamente mística e até mágica, apelando fortemente à mente e às emoções através dos sentidos: o impacto visual da arquitetura, o impacto olfativo do incenso e das velas, o impacto auditivo da liturgia e da música sacra. Em cada detalhe, os templos cristãos refletiam os novos entendimentos da fé, como a crescente separação entre o clero e os leigos, aquele ocupando a abside, onde ficava o altar, e estes a nave do santuário. Eventualmente, na igreja oriental ou grega, uma parede completa passou a separar os dois grupos, denominada iconóstase.

3. O apogeu da cristandade

A Idade Média foi o período em que o poder da Igreja Católica Romana atingiu o seu ponto culminante. A enorme ascendência da igreja sobre todas as áreas da vida e sua estreita associação com o estado produziram na Europa o fenômeno conhecido como “cristandade”, uma sociedade caracterizada por grande uniformidade política e religiosa, sob a liderança dos soberanos e dos papas. Um marco importante foi o pontificado de Inocêncio III (1198-1216), tido como o mais poderoso de todos os pontífices, visto ter imposto a sua autoridade até mesmo sobre reis destacados da época. Essa situação não poderia deixar de refletir-se na arquitetura eclesiástica. A magnificência da igreja e o poder dos seus bispos expressaram-se em templos cada vez mais suntuosos e em uma liturgia altamente sofisticada.

Foi esse o período das magníficas catedrais góticas, que substituíram gradativamente as pesadas estruturas em estilo romanesco, com suas paredes lisas, suas torres quadradas e sua aparência de fortalezas. Externamente, as catedrais impressionavam pelo tamanho e imponência, pela grande altura das torres pontiagudas e pela riqueza de adornos na forma de estátuas, rosáceas e muitos outros recursos estéticos. Eram verdadeiras declarações teológicas em forma de pedra, simbolizando a majestade de Deus e a glória da sua igreja. No seu interior, elas se destacavam pela beleza dos seus vitrais multicoloridos, pelos seus grandes tesouros de pedras e metais preciosos e pela importância de suas relíquias, muitas delas abrigadas em belíssimos relicários. Alguns exemplos bem conhecidos são as catedrais de Notre Dame, Reims, Chartres e Colônia, construídas nos séculos doze e treze.

Essa preocupação quase obsessiva com o aspecto material e visível da religião teve as suas vantagens e desvantagens. No aspecto positivo, foi uma afirmação da beleza e da bondade da criação divina e da realidade da encarnação de Cristo. Todavia, também produziu uma espiritualidade mágica e supersticiosa que obscurecia a centralidade do Deus triúno na devoção cristã. O próprio santuário, suas imagens, suas relíquias e sua liturgia podiam se tornar mais importantes para o cristão comum do que o relacionamento pessoal e direto com Deus. Os meios (as representações materiais) tendiam a tornar-se mais importantes do que os fins, ou seja, as realidades transcendentes para as quais eles apontavam.

4. A Reforma e o período moderno

O protestantismo, com seu princípio básico de “sola Scriptura” (a centralidade das Escrituras) e seu conseqüente questionamento das convicções e práticas calcadas na tradição, porém carentes de sustentação bíblica, fatalmente teria de reconsiderar a questão do significado do espaço sagrado. O retorno a formas de culto mais simples, como as da igreja neotestamentária, e a firme rejeição de qualquer ato de devoção que não fosse dirigido à Trindade, levaram a uma redefinição radical da arquitetura religiosa. Em várias partes da Europa, os templos católicos herdados pelos reformados tiveram suas imagens e altares removidos, e foi eliminada a existência de espaços separados para o clero e para os leigos. Na cidade de Zurique, o reformador Ulrico Zuínglio ordenou que fossem caiadas as paredes das igrejas até então decoradas com pinturas religiosas. No seu zelo, alguns indivíduos e grupos, especialmente na Suíça e no sul da Alemanha, cometeram atos de “iconoclasmo”, destruindo uma grande quantidade de arte sacra com base no segundo mandamento (Êx 20.4-5).

Todavia, no hemisfério norte, a maior parte das denominações protestantes históricas (luteranos, presbiterianos, anglicanos, episcopais, metodistas e outros) manteve um considerável interesse pela arquitetura e pela arte religiosa, como se pode observar nos belos templos dessas confissões existentes na Europa e nos Estados Unidos. Foram os grupos mais contestadores, como, por exemplo, os anabatistas, os quacres e mais tarde os pentecostais, que passaram a utilizar templos deliberadamente simples e despojados. Porém, tanto no caso dos primeiros quanto dos últimos, o santuário nunca chegou a ter a importância e o simbolismo místico que possui nas tradições católica e ortodoxa.

À medida que as igrejas protestantes se difundiram nos demais continentes, ocorreram algumas situações peculiares. Por um lado, houve a tendência de reproduzir nas novas nações alcançadas os modelos, inclusive arquitetônicos e estéticos, das igrejas de origem, sem se atentar para as peculiaridades da cultura local. Foi somente mais tarde, no século 20, com o processo de nacionalização ou indigenização de muitas dessas igrejas, que os seus templos passaram a manifestar as preferências e sensibilidades locais. Em países como o Brasil, a posição da Igreja Católica como religião oficial, e ao mesmo tempo o desejo de atrair imigrantes europeus, fez com que os legisladores autorizassem os protestantes a construir os seus santuários, contanto que não tivessem forma exterior de igrejas. Isso contribuiu para o empobrecimento arquitetônico e artístico dos templos evangélicos, em grande parte monótonos e pouco atraentes.

Em conclusão, as atitudes dos cristãos em relação aos seus locais de culto têm variado grandemente ao longo da história, indo desde o “templocentrismo”, que considera o santuário como um lugar dotado de virtudes especiais, até o desinteresse pelos espaços religiosos em si mesmos, valorizando-se apenas as atividades neles realizadas. Não há como negar a importância psicológica e espiritual dos lugares em que as pessoas têm uma experiência especialmente profunda do sagrado. À luz das Escrituras, importa que a atitude em relação a esses locais seja equilibrada, valorizando-se o belo, o estético e o simbólico, mas evitando-se transformá-lo num fim em si mesmo. Desde uma perspectiva protestante, o templo pode ser considerado “santo” no sentido bíblico de “separado do uso comum” e destinado para o Senhor. Deve ser funcional e prático, visando o que realmente importa, a centralidade do Deus triúno e do culto a ele, mas não há nada que impeça que seja também agradável aos olhos e expresse a beleza da criação divina.

Perguntas para reflexão:

1. No Antigo Testamento, Deus deu instruções detalhadas sobre a edificação de um rico santuário para o seu culto. Por que Cristo não fez o mesmo com os seus seguidores?

2. Em que aspectos a estética de um templo favorece o culto a Deus e em que aspectos pode prejudicá-lo?

3. Certos cristãos, no afã de evitar qualquer sugestão de idolatria ou superstição, evitam utilizar em seus templos quaisquer símbolos ou expressões artísticas? Isso é correto? Por quê?

4. A preferência dos protestantes por templos simples e sem adornos é saudável e teologicamente justificável?

5. Nos Estados Unidos e na Europa, os templos protestantes têm arquitetura e decoração elaboradas (por exemplo, o uso de vitrais).Quais as razões pelas quais os protestantes brasileiros evitam isso? Essas razões são legítimas?

Sugestões bibliográficas:

NOLL, S.F. Tabernáculo, templo. Em ELWELL, Walter A. (Ed.). Enciclopédia histórico-teológica da igreja cristã. São Paulo: Vida Nova, 1988-1990. Vol. III, p. 429-432.

PASTOR, Cláudio. Arte sacra: o espaço sagrado hoje. São Paulo: Loyola, 1993.

VOLKMANN, Martin. Jesus e o templo: uma leitura sociológica de Mc 11.15-19. Porto Alegre: Sinodal, 1992.

http://www.bibliaonline.com.br

http://www.cpljmartins.blogspot.com.br

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Fernandinho - Grandes Coias...


Pastoreia as minhas ovelhas...

Pastoreia as minhas ovelhas: o ministério cristão em perspectiva histórica

Nos últimos anos, os meios de comunicação têm noticiado com freqüência preocupante muitos casos de pastores e sacerdotes que têm sido infiéis no exercício de seu elevado encargo, envolvendo-se com delitos sexuais, desonestidade financeira e abuso de autoridade, entre outras situações. Muitas vezes, esses problemas têm trazido ruína para a vida pessoal dos envolvidos, vergonha para as suas congregações e descrédito para a igreja e para o evangelho. Essa triste realidade torna oportuna e necessária uma reflexão bíblica e histórica acerca do ministério cristão.

1. O ensinamento bíblico

A Escritura Sagrada ensina que Deus é o supremo dirigente e orientador do seu povo. Algumas passagens significativas que apontam para isso são Gn 49.24; Sl 23.1-4; 80.1; 100.3 e Is 40.10-11. A mesma verdade é afirmada a respeito do Messias, o Cristo (ver Mq 5.4; Mt 2.6; Jo 10.11-16; Hb 13.20; 1 Pe 2.25; 5.4; Ap 7.17). Um exame desses textos mostrará que o termo mais usado é “pastor”: Deus ou Cristo é o supremo pastor do seu povo, estando incluídos nesse conceito as idéias de sustento, proteção, direção e disciplina, entre outras. Ao mesmo tempo, a Bíblia mostra que Deus (Cristo) houve por bem nomear representantes humanos para exercerem liderança e assistência espiritual no meio do seu povo. Na velha dispensação esses líderes foram principalmente os reis, os juízes, os sacerdotes e os profetas. Na nova dispensação, Deus entregou a sua igreja aos cuidados dos apóstolos e dos presbíteros ou bispos.

Assim como acontece com Deus Pai e Jesus Cristo, também no caso dos líderes humanos uma das figuras que melhor descrevem as suas funções e responsabilidades é a do pastoreio das ovelhas (ver Jo 21.15-17; At 20.28; Ef 4.11; 1 Pe 5.2). No Antigo Testamento, o grande protótipo do pastor é o rei Davi (2 Sm 5.2; Sl 78.70-72; Ez 34.23) e no Novo Testamento, o apóstolo Paulo (At 20.18-35; 2 Co 6.4-13; 1 Ts 2.1-12). Outro termo bíblico de grande relevância é “ministro” (diákonos, leitourgós, hyperétes), ou seja, aquele que serve. Os ministros são servos tanto de Deus quanto da igreja, o povo de Deus. Suas tarefas incluem pregar, alimentar, edificar, interceder, convencer, consolar, repreender, advertir e exortar os fiéis em sua vida cristã.

São freqüentes nas Escrituras as passagens que falam dos deveres e das qualificações dos pastores e ministros (Jr 3.15; At 6.4; Rm 12.7; 1 Co 4.1-2; 2 Co 4.1-10; 5.18-20; 1 Tm 3.1-7; 5.17-20; 2 Tm 4.5; Tt 1.5-9). Por outro lado, existem muitas advertências a respeito dos líderes relapsos e infiéis, “que se apascentam a si mesmos” e abandonam o rebanho do Senhor. Ver Jr 23.1-4; 50.6; Ez 34.1-31; Zc 11.5,17; 1 Pe 5.1-4. Segundo os preceitos bíblicos, o verdadeiro pastor é o líder revestido do Espírito Santo que amorosamente supervisiona, guia, ensina e adverte o povo de Deus.

2. Igreja antiga e medieval

A partir dos primeiros séculos da era cristã, ocorreram vários desdobramentos que dificultaram o fiel exercício do pastoreio cristão em moldes bíblicos. Entre eles podem ser citados o excesso de institucionalização da igreja, a crescente distinção entre clero e laicato, e a ênfase na vida monástica. Esses fenômenos criaram um progressivo distanciamento entre a hierarquia e o povo, fazendo com que os ministros tivessem dificuldade em desempenhar de modo eficaz as suas funções pastorais.

Todavia, as ações e os escritos de muitos líderes desse período dão testemunho da contínua relevância e necessidade do ofício pastoral. No segundo século, Policarpo de Esmirna, escrevendo aos filipenses, declarou: “Os presbíteros também devem ser compassivos, misericordiosos para com todos, reconduzindo aqueles que se desviam, visitando os enfermos, não negligenciando a viúva, o órfão e o pobre, mas sempre considerando o que é honroso aos olhos de Deus e dos homens, refreando toda ira, parcialidade e julgamento injusto, afastando-se de todo amor ao dinheiro, não pensando mal de alguém apressadamente, não sendo severo no juízo, sabendo que todos somos devedores ao pecado”. No terceiro século, Clemente de Alexandria e seu discípulo Orígenes também destacaram que os ministros são escolhidos para servir o Senhor, moderam as suas paixões, obedecem aos superiores, bem como ensinam e cuidam das ovelhas.

O grande bispo da igreja oriental João Crisóstomo (c. 347-407) não só foi o pregador mais eloqüente do seu tempo como destacou a importância da pregação no exercício do ministério cristão. Em um tratado acerca do sacerdócio, ele afirmou: “Há somente um método e meio de cura quando erramos, que é a poderosa aplicação da Palavra... com ela nós tanto despertamos a alma que dorme quanto a subjugamos quando se inflama; com ela cortamos os excessos, preenchemos as lacunas e realizamos todas as outras operações necessárias para a saúde da alma”.

Na igreja ocidental, o insigne Agostinho de Hipona (354-430) soube, como poucos, unir uma intensa reflexão teológica com um envolvimento prático no trabalho pastoral. Ele disse em uma de suas cartas: “Nesta vida, especialmente em nossos próprios dias, não há nada mais difícil, estafante e arriscado do que o ofício de bispo, sacerdote ou diácono; porém, nada é mais abençoado aos olhos de Deus, se o nosso serviço estiver de acordo com as ordens do nosso Capitão”.

Um marco importante na história da “cura de almas” foi o pontificado de Gregório Magno (590-604), cujo Livro de Regra Pastoral veio a ser um manual extremamente valioso para o clero secular durante toda a Idade Média. Todavia, continuaram a surgir obstáculos nessa tarefa: a evangelização superficial de grandes contingentes populacionais, em que um verniz de cristianismo recobria o paganismo subjacente; o aumento da riqueza e poder político da igreja, o que levou muitos papas, bispos e abades a negligenciarem o seu rebanho; as deficiências na formação dos sacerdotes, tantas vezes carentes de preparo ministerial e disciplina pessoal. Outros exemplos de preocupação pastoral nesse longo período são encontrados em grupos cristãos dissidentes como os donatistas, os valdenses e os albigenses, bem como entre os chamados pré-reformadores, notadamente John Wycliffe e Jan Hus. Este último disse em sua obra Sobre o Ofício Pastoral: “Existem duas coisas que pertencem ao status do pastor: a sua santidade e a integridade do seu ensino”.

3. A Reforma e o período moderno

A Reforma Protestante foi um movimento motivado em grande parte por preocupações pastorais, como ficou patente nos escritos e ações dos reformadores. Martinho Lutero (1483-1546) deu grande ênfase ao cuidado pastoral, que ele sempre relacionou diretamente com o ministério da Palavra. João Calvino (1509-1564) foi ainda além, dando imensa contribuição para o entendimento bíblico do ministério cristão. Ele devotou à igreja o quarto livro da sua Instituição da Religião Cristã, referindo-se a ela como a “mãe e mestra” dos fiéis, aquela que os gera através da pregação do evangelho e os educa na fé durante toda a sua vida. Em outro escrito, ele propôs para a igreja reformada de Genebra o quádruplo ofício de pastor, mestre, presbítero e diácono, destacando assim o valor da pregação, do ensino e do cuidado espiritual e material da comunidade cristã.

O reformador alemão Martin Bucer (1491-1551), sediado em Estrasburgo, foi chamado “o teólogo pastoral da Reforma”. Em sua obra O Reino de Cristo, ele identificou três deveres de um pastor: ensinar as Escrituras, ministrar os sacramentos e participar da disciplina eclesiástica. Um quarto dever era a assistência aos necessitados. Os anabatistas, em seu esforço de retornar aos padrões da igreja primitiva, também deram grande ênfase ao modelo pastoral espelhado no Novo Testamento, conforme exemplificado pelo trabalho e escritos de Menno Simons e seus colegas. Entre os fatores que contribuíram para essa revitalização da cura de almas nas igrejas da Reforma estava o retorno aos ensinos bíblicos sobre o ministério, a abolição das categorias de clero e leigos, a maior proximidade entre os líderes e os fiéis, e a vida coesa e participativa das comunidades evangélicas.

Dentre os movimentos subseqüentes, aquele que possivelmente produziu maiores frutos no âmbito pastoral foi o puritanismo inglês. Um nome de grande importância é o de Richard Baxter (1615-1691), cuja obra mais conhecida é O Pastor Reformado, escrito em 1656. O livro se fundamenta em Atos 20.28 para articular uma filosofia profundamente espiritual de ministério que aborda os labores, as motivações, as limitações e a dedicação dos pastores. Além de devotar-se zelosamente à pregação, todos os anos Baxter procurava encontrar-se pessoalmente com cada uma das 800 famílias da sua igreja para aconselhá-las e orar com elas, uma prática que transformou permanentemente a vidas dessas pessoas. Ele declarou: “Por amor a Cristo, e em prol da sua igreja e das almas imortais dos homens, eu rogo a todos os fiéis ministros de Cristo que se dediquem urgente e efetivamente a esse mister”.

No contexto intensamente bíblico das igrejas puritanas, o ensino e a prática do ministério genuíno se tornaram comuns, como ocorreu na obra de vultos como John Owen, Thomas Brooks, Richard Sibbes, Robert Bolton, Thomas Menton e Thomas Goodwin, entre outros. Nos Estados Unidos, a maior expressão dessa nobre tradição foi Jonathan Edwards (1703-1758), o notável pastor, teólogo e filósofo da Nova Inglaterra. Ele considerava uma grande bênção “o ministro que alegremente se dedica ao serviço do seu Senhor na obra do ministério, como uma obra na qual tem prazer, e também alegremente se une à sociedade dos santos sobre a qual foi colocado... e estes, por sua vez, alegremente o recebem como uma dádiva preciosa do seu Redentor glorificado”. Após a era puritana, destacaram-se por suas contribuições à teologia e à prática do ministério nomes como Charles Spurgeon, G. Campbell Morgan, Roland Allen, Benjamin Warfield e, mais recentemente, D. Martyn Lloyd-Jones, Jay Adams e John MacArthur, entre muitos outros.

Conclusão

Os dias em que vivemos são complexos e repletos de desafios. Nas áreas política, empresarial e institucional existe a expectativa de que os líderes sejam ao mesmo tempo íntegros, competentes e dinâmicos. Essa expectativa também se verifica no meio religioso, mas com um diferencial. Os ministros devem prestar contas de seus atos não somente aos seus paroquianos, mas principalmente àquele que os vocacionou e capacitou para o seu nobre ofício – o próprio Deus. Numa época em que o trabalho pastoral se torna uma atividade entre outras, em que os ministros correm o risco de serem meros “profissionais do púlpito”, em que motivações secundárias ou menores buscam a supremacia no coração dos pastores, vale a pena ouvir a exortação de Paulo ao seu colega mais jovem: “Cumpre cabalmente o teu ministério” (2 Tm 4.5).

domingo, 8 de dezembro de 2013

Zelo sem entendimento...

Zelo sem entendimento: os problemas do entusiasmo religioso na história do cristianismo

Em todas as religiões existe o fenômeno do fervor espiritual intenso, por vezes extremado, que caracteriza certos indivíduos, grupos e movimentos. O cristianismo não é uma exceção. Um termo técnico usado para descrever essa atitude é “entusiasmo”, palavra cujo sentido original é “ser possuído ou inspirado pela divindade” (de “en” = dentro + “theos” = deus). O entusiasta, em virtude da sua experiência profunda e arrebatadora com o divino, é com freqüência tomado de grande paixão e ardor nos seus sentimentos religiosos. Isso não é necessariamente algo negativo. Na verdade, ao longo dos séculos o fervor religioso tem produzido frutos admiráveis em áreas como a espiritualidade e a obra missionária. Alguns exemplos bem conhecidos são os místicos espanhóis do final da Idade Média e o conde protestante alemão Nikolaus von Zinzendorf, com seus seguidores morávios.

Infelizmente, a história demonstra que muitas vezes o entusiasmo religioso ultrapassa os limites do bom senso e manifesta extravagâncias comportamentais e teológicas. Em alguns casos extremos chega ao fanatismo, com as conseqüências negativas, até mesmo destrutivas, daí advindas. Ironicamente, o entusiasmo mal-dirigido pode proceder de um desejo sincero de glorificar a Deus. Paulo, escrevendo aos romanos acerca de seus compatriotas judeus, afirmou que estes possuíam “zelo por Deus, porém não com entendimento” (Rm 10.2), e ele mesmo, antes de conhecer a Cristo, em seu zelo pela lei de Deus foi um perseguidor da igreja (Fp 3.6; ver Jo 16.2). Uma característica freqüente do entusiasmo religioso cristão é a sua associação com expectativas apocalípticas e com as experiências sobrenaturais ligadas às mesmas, tais como revelações, visões e profecias.

1. Cristandade antiga e medieval

A primeira ocorrência bem documentada de entusiasmo na igreja antiga foi o montanismo. Esse influente movimento teve início no ano 172 quando o jovem Montano começou a chamar a atenção como profeta na Frígia, Ásia Menor. Duas profetizas, Priscila e Maximila, logo se tornaram suas seguidoras e afirmavam ser porta-vozes do Paracleto, o Espírito Santo. Às vezes supostamente Deus falava através deles na primeira pessoa, como através dos profetas do Antigo Testamento. A sua mensagem principal era a proximidade do fim do mundo e da segunda vinda de Jesus Cristo. Como preparação para isso, os cristãos eram exortados a praticar um rigoroso ascetismo, abstendo-se de relações conjugais e fazendo numerosos jejuns. Também eram exortados a receber de bom grado as perseguições.

A liderança da igreja sentiu-se ameaçada pela autodenominada “Nova Profecia” e os montanistas acabaram sendo excomungados. Alguns grupos sobreviveram até o século quinto no norte da África e por mais tempo na Frígia. Apesar de alguns excessos, esses antigos cristãos chamaram a atenção da igreja para a pessoa do Espírito Santo e a importância de uma vida disciplinada. Esses fatores atraíram o grande intelectual cristão Tertuliano de Cartago, que se tornou montanista no final da sua vida. A partir dessa época, todas as reivindicações de inspiração direta foram firmemente desencorajadas pela igreja ocidental.

Ainda assim, durante a Idade Média ocorreram alguns casos de maior ou menor impacto. No final do século 12, Joaquim de Fiore, da Calábria, sul da Itália, ensinou que a era do Espírito iria começar no ano 1260 e esboçou com detalhes os eventos dos sessenta anos precedentes. Começando com o Apocalipse, ele e seus muitos discípulos anunciaram novas revelações. Fiore atraiu a atenção de quatro papas e influenciou a nascente ordem franciscana, mas, quando suas predições não se confirmaram, seu movimento se extinguiu. Algum tempo depois, Guilhermina da Boêmia, uma entusiasta lombarda, afirmou ser uma encarnação do Espírito para salvar os judeus, os sarracenos e os falsos cristãos. Logo após a sua morte em 1281, sua seita foi exterminada. Outros exemplos medievais são os flagelantes do norte da Europa (século 14), os taboritas da Boêmia (século 15) e os alumbrados ou illuminati da Espanha (século 16), todos os quais foram fortemente reprimidos pelos poderes constituídos. Os estudiosos apontam para o fato de que, além das motivações religiosas, esses movimentos refletiram reações populares a situações de grande tensão econômica e social.

2. O período da Reforma

A Reforma Protestante desencadeou forças latentes que em diversas ocasiões produziram manifestações de intensa excitação religiosa. No aspecto negativo, o caso mais notório ocorreu na cidade de Münster, na Westfália. Tudo começou com o curtidor Melchior Hofmann, que em 1529 chegou a Estrasburgo e anunciou o iminente fim do mundo, sendo que essa cidade seria a Nova Jerusalém. Dizendo ser o profeta Elias, ele viajou pelo norte da Alemanha e a Holanda, impregnando o movimento anabatista com fortes convicções milenistas. Após a sua prisão, ergueu-se um novo líder na pessoa do padeiro holandês Jan Matthys. Afirmando ser Enoque, ele anunciou que a Nova Jerusalém seria de fato Münster.

Muitos anabatistas afluíram para essa cidade e eventualmente adquiriram o controle político da mesma, implantando uma teocracia.

Quando Matthys morreu numa batalha contra o exército do bispo, seu principal apóstolo, Jan de Leyden, foi logo reconhecido como profeta. Poucos meses depois, mediante uma profecia, ele foi declarado “rei de justiça” e o “governante da nova Sião”. No Ano Novo de 1535, promulgou um novo código legal, concluindo com as palavras: “A voz do Deus vivo declarou-me que esta é uma ordenança do Todo-Poderoso”. Alguns dos profetas do movimento proclamaram que a ética do Antigo Testamento ainda era válida e por isso sentiram-se autorizados a introduzir a poligamia. Em 25 de junho daquele ano, após um cerco prolongado e angustioso, a cidade foi tomada pelo exército episcopal e quase todos os habitantes foram massacrados.

Os reformadores foram críticos dos anabatistas por entenderem que eles ameaçavam a ordem social, uma vez que insistiam em manter-se separados tanto do Estado quanto da coletividade. Outra razão dessa hostilidade era teológica: a liberdade com que alguns grupos interpretavam as Escrituras e o seu apelo a revelações diretas pareciam relativizar a Palavra de Deus. João Calvino, por exemplo, escreveu várias obras contra o movimento, uma das quais intitulada Contra a fanática e furiosa seita dos libertinos que a si mesmos se denominam espirituais (1545). Durante séculos, governos e igrejas exploraram os excessos cometidos por alguns anabatistas isolados, para fazerem do movimento como um todo um sinônimo de fanatismo e desordem.

3. Os grandes despertamentos

Como não poderia deixar de ser, os avivamentos religiosos, com seu poderoso conteúdo emocional, são um terreno fértil para a ocorrência de expressões entusiásticas. Isso se tornou especialmente inevitável no ambiente volátil da fronteira norte-americana nos séculos 18 e 19. No Primeiro Grande Despertamento (décadas de 1720 a 1740), pregadores como Theodore Frelinghuysen, Gilbert Tennent, Jonathan Edwards e George Whitefield souberam manter o equilíbrio e a sobriedade. O mesmo não aconteceu com outros avivalistas, como James Davenport, que apelaram fortemente para o emocionalismo. A conseqüência disto foi o surgimento de uma forte polarização entre os chamados “novas luzes” (favoráveis ao avivamento) e os “velhas luzes” (contrários ao mesmo).

No Segundo Grande Despertamento (1800-1830), mais vasto e explosivo, tornaram-se comuns certas dramáticas manifestações físicas de êxtase religioso: desmaios, rodopios, gargalhadas, grunhidos, convulsões e danças. Mais que isto, o entusiasmo acabou gerando novos movimentos, alguns bastante divergentes do protestantismo histórico, tais como os experimentos comunitários e outros grupos heterodoxos (shakers, mórmons, adventistas, etc.). Isso não quer dizer que não tenha havido muitos aspectos positivos nesses avivamentos. Jonathan Edwards (1703-1758), o pastor e teólogo da Nova Inglaterra que se tornou o grande estudioso desses fenômenos, concluiu que as manifestações físicas podiam ser sinais do poder de Deus ou não. Para se avaliar a autenticidade de um avivamento, era preciso procurar os frutos duradouros, tanto pessoais quanto coletivos, que resultavam dessas intensas experiências espirituais.

Finalmente, o início do século 20 viu nascer o pentecostalismo, um movimento que, devido a suas peculiaridades intrínsecas, possui uma espiritualidade fervorosa, carregada de emotividade. A ênfase no Espírito Santo e seus dons extraordinários, a linguagem do poder e a expectativa do final dos tempos têm produzido inegável vitalidade e notáveis transformações, mas também podem, quando mal-orientadas, gerar excessos como os associados com a “experiência de Toronto”, bem como distorções teológicas, principalmente na área do culto e da escatologia.

Conclusão

É longa a história do entusiasmo religioso desordenado e seus riscos. Em alguns casos excepcionais, as conseqüências podem ser trágicas. Dois exemplos do Brasil do século 19 foram Canudos e seu profeta Antônio Conselheiro, na Bahia, e a revolta dos muckers, no Rio Grande do Sul. Dois episódios mais recentes em outros países foram o suicídio coletivo dos seguidores de Jim Jones, na Guiana, e a morte de David Koresh e seus simpatizantes em Waco, no Texas. Não se deseja aqui denunciar o entusiasmo religioso per se, que, como foi apontado, tem produzido frutos admiráveis na história do cristianismo. O próprio apóstolo Paulo disse: “No zelo não sejais remissos: sede fervorosos de espírito, servindo ao Senhor” (Rm 12.11). Mas o mesmo escritor inspirado, ao orientar os fiéis de Corinto quanto à sua espiritualidade, acrescentou: “Tudo, porém, seja feito com decência e ordem” (1 Co 14.40).

Perguntas para reflexão:

1. Qual deve ser a relação entre a racionalidade e a emotividade na vida espiritual, quer pessoal, quer coletiva?

2. À luz do ensino bíblico, é correto esperar comunicações diretas e novas revelações de Deus ao seu povo hoje, sem ser através das Escrituras Sagradas? Por quê?

3. Qual é a relação entre o Espírito Santo e a Palavra de Deus na vida da igreja e do crente?

4. Quais os principais problemas que podem resultar de uma ênfase excessiva no aspecto emocional da religião?

5. Por que a intensidade de sentimentos não deve ser o critério mais importante para se julgar a autenticidade de uma experiência religiosa?


Sugestões bibliográficas:

GRUDEM, Wayne (Org.). Cessaram os dons espirituais? Quatro pontos de vista. São Paulo: Editora Vida, 2003.

HANEGRAAFF, Hank. Cristianismo em crise. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembléias de Deus, 1996.

LOPES, Augustus Nicodemus. O que você precisa saber sobre batalha espiritual. 2ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 1998.

MacARTHUR JR., John F. Os carismáticos: um panorama doutrinário. 3ª ed. São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 1995.

MATOS, Alderi S. e outros. Fé cristã e misticismo: uma avaliação bíblica de tendências doutrinárias atuais. São Paulo: Cultura Cristã, 2000.

PIERATT, Alan B. O evangelho da prosperidade: análise e resposta. São Paulo: Vida Nova, 1993.

ROMEIRO, Paulo. Evangélicos em crise. São Paulo: Mundo Cristão, 1995.

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